Introdução
Na primeira unidade, estudamos os principais documentos que compõem a legislação educacional no Brasil, bem como o período da redemocratização, os preceitos básicos contidos na Constituição Cidadã, a construção da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN) e a formulação do Plano Nacional de Educação (PNE) atualmente em vigor, Lei nº 13.005/2014. Agora, nesta unidade, vamos nos concentrar na organização das leis que versam sobre a educação básica, tendo como perspectiva de análise o processo histórico dessa legislação.
Quando falamos em processo histórico, podemos entendê-lo como um método de análise que visa englobar os aspectos políticos, sociais, culturais e econômicos em uma narrativa coesa e que fornece um eixo explicativo a partir de um recorte temporal. Esse tipo de análise permite entender quais problemas da educação brasileira são conjunturais e, portanto, podem ser pensados em curto e médio prazo, e quais são estruturais, exigindo esforço muito maior e de longa duração. Por esse motivo, vamos iniciar abordando, de forma mais detalhada, como se articulam, atualmente, o Estado, a sociedade civil e as políticas educacionais no Brasil.
Organização e Legislação da Educação Básica no Brasil: Aspectos Históricos, Políticos e Sociais
Para que possamos construir uma perspectiva crítica com relação às políticas educacionais em vigor em nosso país, é necessário partir dos problemas estruturais da sociedade brasileira. Desde a década de 1980, engendrou-se, em nosso país, uma compreensão mais ou menos coesa da necessidade da superação das desigualdades sociais. Apesar de os diferentes grupos políticos apresentarem divergências profundas em suas compreensões sobre as melhores formas de conduzir a superação dessas desigualdades, quase todos entendem a educação como uma ferramenta elementar para a superação do abismo econômico que divide os brasileiros.
A fim de analisar os aspectos da relação entre Estado, sociedade civil e educação, partiremos, então, do caráter histórico excludente da formação social do Brasil, que só muito tardiamente passou a incorporar as classes mais pobres no sistema educacional. Tendo em vista que nossa democracia ainda é jovem e, portanto, passa por fragilidades e ameaças constantes, o fortalecimento da legislação educacional ainda está em debate e constante reformulação.
Apontamentos Históricos: Estado, Sociedade Civil e Educação
A educação é um dos serviços fundamentais oferecidos pelo Estado, junto com a segurança e a saúde pública. No entanto, essas são concepções modernas do papel do Estado, que nem sempre estiveram presentes entre os governantes. A atuação do Estado como prestador de serviços essenciais é algo recente em termos históricos. Nossa concepção moderna de Estado foi gestada durante um longo período, que se estende do final do século XIII até o final do XVI. Iniciou-se quando os reis, principalmente da França e da Inglaterra, mudaram sua compreensão de que governar era apenas “conservar o seu estado”, ou seja, apenas defender a sua posição de rei, para uma ideia de que existe uma ordem legal, constitucional e administrativa distinta ao governante e que é seu dever conservar uma nação, e não apenas de defender o seu status (SKINNER, 1996).
Nessa perspectiva, o Estado é um conjunto de organizações administrativas que governam uma nação e que servem a certos interesses. Em um primeiro momento, serviu unicamente aos interesses das monarquias. Posteriormente, com a ascensão das cidades, do comércio e da indústria, a burguesia foi conquistando espaço até se tornar a classe dominante. Com o aprofundamento das lutas sociais, principalmente a partir do século XIX, no período da industrialização, foi necessário englobar os novos atores sociais no jogo político, principalmente as classes trabalhadoras, que exigiam maior participação nas decisões do Estado. Nesse momento, houve, então, um aprofundamento na compreensão sobre a democracia.
O Brasil herdou a cultura gestada na Europa Ocidental durante os séculos XVI e XVIII, mesclada com as necessidades da empresa colonial e, mais tarde, do Império. Com a Proclamação da República em 1889, a país adotou o regime presidencialista com um sistema eleitoral muito restrito – só tinham direito ao voto sujeitos letrados com certo nível de renda e posse de terras –, que excluía as populações pobres, as mulheres e os negros. Conforme a historiografia, este tempo é classificado como Primeira República, um período que não pode ser considerado democrático, apesar de ser um regime presidencialista e republicano. Posteriormente, passamos pela Segunda República (1930-1937), ou a Era Vargas, período após a Revolução de 1930 e fundamental para a história das políticas educacionais no Brasil.
No caminho da modernização, nosso país passou por algumas das etapas percorridas pelos países europeus. Obviamente, é necessário contextualizar esse percurso, mas que pode ser pensado a partir de um mesmo mecanismo histórico de desenvolvimento. Ao passo que a Europa passou por um período de industrialização durante os séculos XVIII e XIX, nossa indústria surgiu tardiamente e, até os dias de hoje, ainda não conseguiu superar a importância econômica dos produtos de origem primária destinados à exportação (passamos pelos ciclos econômicos do pau-brasil, do açúcar, do café e, atualmente, abastecemos outros países com soja, milho e minérios).
Mesmo que o processo de industrialização não tenha sido completo, ele alterou profundamente as estruturas sociais brasileiras a partir de 1930. Para Romanelli (1986), 1930 é a década de virada na história da educação no Brasil. Desde o período colonial, pouca coisa havia mudado substancialmente, e ainda havia muita herança dos padres jesuítas.
Assim, a alteração no panorama econômico do Brasil modificou profundamente o sistema de ensino, criando uma demanda de trabalhadores que deveriam ser “produzidos” pela escola. Em 1930, ocorreu uma forte expansão do ensino, devido à crescente demanda social por educação, alavancada por dois fatores: o gradual crescimento demográfico e a intensificação do processo de urbanização.
A gênese da educação para o desenvolvimento econômico surgiu da modernização das estruturas econômicas, sociais e políticas da sociedade civil brasileira. Hoje, temos diversos exemplos de países que investiram massivamente na educação, gerando um mercado interno dinâmico, com maiores salários, diminuindo desigualdades sociais e estabilizando o crescimento (ROMANELLI, 1986).
Historicamente, estruturou-se o consenso global de que a educação gera retornos sociais e econômicos que justificam os investimentos em larga escala. A ciência e a tecnologia são o motor do progresso nas sociedades capitalistas e tornam os países mais produtivos, possibilitando à população maior poder de consumo. A educação para o desenvolvimento possuía um viés economicista extremado, segundo o qual a população só era qualificada para o melhor funcionamento do mundo do trabalho, pouco importando se possuía capacidade de produzir visões críticas e profundas sobre o mundo em que se vivia. O mais importante era ensinar aos trabalhadores operações técnicas e reservar à elite o domínio do conhecimento profundo.
Apesar de precário, esse modelo educacional produziu resultados positivos. Como afirmam Pieri e Santos (2014), seus retornos não são apenas econômicos. Sociedades com altas taxas de escolarização têm melhores índices de saúde, de qualidade de vida e de longevidade, além de realizarem escolhas políticas mais bem informadas e apresentarem menor taxa de criminalidade, diminuindo progressivamente as convulsões sociais (PIERI; SANTOS, 2014).
A economia colonial baseada na extração de madeira nobre e outras especiarias da natureza, passando para a economia escravagista da cana-de-açúcar e, posteriormente, do café, não necessitava de trabalhadores educados e especializados, já que o trabalho era predominantemente rural.
Fonte: Patrick Guenette / 123RF.
Após o fim da escravidão, em 1888, e a Proclamação da República, o Brasil demorou ainda algumas décadas para empreender um projeto de industrialização. A República de 1890 surgiu com forte inspiração positivista, trazendo a forte crença no progresso pela ciência, de modo que a escolarização chegasse a algumas camadas sociais que, até então, não eram por ela contempladas.
Nesse período, novos atores sociais entraram em cena, como os trabalhadores urbanos, as mulheres e os negros, que precisam ser incorporados nessa nova sociedade, necessitando, para isso, de uma qualificação mínima para o trabalho na indústria. Essa educação, mesmo que precária e técnica, aumentou paulatinamente a demanda educacional (ROMANELLI, 1986).
Como vimos, conforme Romanelli (1986), a partir da década de 1930, originou-se, no Brasil, uma educação para o desenvolvimento. A sociedade brasileira, até esse período, era herdeira de um legado cultural europeu, e, portanto, a cultura letrada brasileira era bastante restrita, destinada a alguns círculos acadêmicos e literários das elites. Até 1930, não havia uma grande preocupação do Estado em fornecer educação aos cidadãos. O crescimento urbano e a industrialização acarretaram a formação de uma sociedade civil de consumo no Brasil, com a qual surgiu a demanda pela educação. As exigências dos novos tempos fez com que o sistema educacional arcaico e restritivo do período anterior se tornasse um empecilho ao desenvolvimento econômico.
FIQUE POR DENTRO
Manifesto dos Pioneiros de 1932
Foi publicado, em 1932, o Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova. O documento foi escrito por proeminentes intelectuais da época, como Fernando de Azevedo, Hermes Lima, Cecília Meireles, Anísio Teixeira, entre outros. Nesse documento, foram apresentadas propostas de soluções para os problemas da educação brasileira, principalmente para recuperar as décadas de atraso. O movimento ficou conhecido como Escola Nova, opondo-se ao modelo tradicional, em que o professor era a autoridade e o detentor do conhecimento, enquanto o aluno era um mero receptor. A Escola Nova colocou o aluno como centro dos debates, sendo de suas experiências que deveriam partir as práticas docentes, utilizando-se de ferramentas como a observação, os laboratórios e a realização de oficinas. Para saber mais, acesse o documento publicado integralmente no link: http://www.histedbr.fe.unicamp.br/revista/edicoes/22e/doc1_22e.pdf.
Fonte: Azevedo et al. (2006).
No Brasil: o Percurso Legal das Políticas Educacionais
Para que possamos entender com mais clareza o percurso legal de uma política educacional, é importante conhecermos quais são os passos para a construção e a aprovação do PNE 2001-2010. Seguindo esse exemplo, desde sua formulação até sua efetiva implementação na máquina administrativa do governo e a avaliação final de seu alcance, poderemos ter uma visão mais clara de como são produzidas as políticas educacionais.
Conforme disposto no artigo 204 da Constituição de 1988, é obrigação dos governos elaborar os Planos Nacionais de Educação (PNEs), plurianuais, que deverão ser transformados, posteriormente, em lei. Em Emenda Constitucional de 2009, os planos passaram a ser decenais, devendo conter objetivo e metas claras para a implementação das políticas educacionais em longo prazo.
O PNE 2001-2010, Lei nº 10.172, de 09 de janeiro de 2001, foi constituído de 295 metas, agrupadas em cinco prioridades. Lembre-se de que, na unidade I, falamos do atual plano em vigor, Lei nº 13.005, de 25 de junho de 2014, que contém apenas 20 metas. Esse documento foi o resultado de intensas disputas no Legislativo envolvendo as duas versões do plano. O primeiro projeto a chegar ao Congresso para debate foi o Plano Nacional de Educação: proposta da sociedade brasileira, construído coletivamente por profissionais da educação, movimento estudantil e diversas organizações da sociedade civil (OSCs). Ele foi apresentado como oposição ao projeto do governo, e, logo em seguida, o Poder Executivo apresentou outro projeto, intitulado Plano Nacional de Educação: proposta do Executivo ao Congresso Nacional (MOURA, 2015).
Este documento, apresentado pelo governo, baseava-se no Plano Decenal de Educação para Todos, fruto de resoluções apresentadas na Conferência Mundial da Educação para Todos, realizada na Tailândia, em 1990. Cabe pontuar que suas diretrizes seguiram recomendações internacionais, fortemente vinculadas à concepção neoliberal de educação (que discutiremos à frente).
Segundo Saviani (2007) e Cury (1998), o plano apresentado pela União tinha por objetivo a constrição dos gastos públicos e a descentralização e transferência da responsabilidade para estados e municípios, iniciativa privada e organizações não governamentais (ONGs). Nesse projeto de PNE, o Poder Executivo isentava-se de responsabilidades, principalmente de investimento, cabendo a ele apenas a fiscalização, a avaliação e o apoio técnico (SAVIANI, 2007; CURY, 1998). Segundo Moura (2015), muitos debates se deram em torno da porcentagem do produto interno bruto (PIB) que deveria ser investida na educação. O governo tentou moderar as pressões por maiores investimentos, defendendo que o percentual investido pelo Brasil na área era o mesmo de muitos países desenvolvidos (MOURA, 2015).
O outro projeto de lei, o PNE da Sociedade Brasileira, foi elaborado coletivamente por muitos profissionais da educação, em conjunto com o movimento estudantil, principalmente durante os dois Congressos Nacionais de Educação (Coneds), ocorridos em agosto de 1996 e novembro de 1997. O documento foi enviado ao Congresso como projeto de lei em fevereiro de 1998, encabeçado pelo deputado federal Ivan Valente, mais de 60 outros parlamentares e todas as lideranças dos partidos de oposição ao governo do presidente Fernando Henrique Cardoso (do Partido da Social Democracia Brasileira [PSDB]).
O PNE da Sociedade Brasileira divergia do projeto do governo em muitos aspectos, mas principalmente por lograr contemplar “dimensões e problemas sociais, culturais e políticos e educacionais brasileiros” (MOURA, 2015, p. 12), concentrando-se na busca por justiça social. Esse projeto de PNE fazia uma crítica à perspectiva de educação pelo desenvolvimento que apresentamos no início da unidade, enfatizando que o objetivo da educação não era apenas a formação de capital humano para o mundo do trabalho, mas, principalmente, uma ferramenta de emancipação que possibilitasse à população formular críticas sobre a sociedade em que vivemos (MOURA, 2015).
Esse foi o primeiro PNE construído sob a nova Constituição. Seu objetivo era elaborar um plano educacional que partisse da própria sociedade e que envolvesse vários atores sociais. Com relação ao financiamento, ponto candente dos debates, o projeto de PNE da Sociedade Brasileira argumentava que o gasto corrente com educação era de 2,5% do PIB e que era necessário 10% de investimento para que a política fosse efetiva.
Em 2001, o projeto final aprovado pelo Legislativo manteve a estrutura da proposta do Executivo, repetindo 11 temas encontrados no documento original. Durante o Fórum Nacional de Educação realizado em 2011 para avaliar os resultados da PNE, evidenciou-se que o projeto era composto de 75% de conteúdo da proposta do governo e do Ministério da Educação e 25% do conteúdo da proposta da sociedade brasileira. Embora as metas tenham sido mescladas, incorporando reivindicações de ambas as partes, a maioria das diretrizes seguia os interesses do governo.
Segundo Dourado (2010) e Moura (2015), o plano possuía muitas metas, apresentando uma formulação bastante genérica e constituindo mais uma diretriz geral de política educacional do que um alvo a ser buscado e avaliado. Posteriormente, o plano aprovado no Congresso Nacional teve nove metas vetadas por recomendação da área econômica do governo, gerando fortes críticas ao PNE 2001-2010, segundo as quais não foram disponibilizados recursos para a execução de tantas metas e não havia sido indicado pelo PNE quais as fontes de financiamento dessas políticas educacionais (DOURADO, 2010; MOURA, 2015).
A partir de 1988, com a redemocratização e a Constituição Cidadã, certos preceitos básicos sobre as metas educacionais ficaram claros, principalmente a importância da educação básica e o tema da inclusão e da educação como ferramentas de enfrentamento da desigualdade.
Os projetos podem ser elaborados pela sociedade civil, com ou sem a participação do governo, ou ainda podem ser elaborados pelo próprio Poder Executivo. Neste caso, a política educacional do Executivo pode entrar em confronto ou pode ser fundida com as propostas da sociedade. O PNE 2001-2010 foi construído com a participação de um movimento pela educação e de profissionais da área, fator muito importante, uma vez que são esses indivíduos que vivenciam o cotidiano das escolas e das universidades. Em seguida, esses projetos vão para o Congresso, sendo intensamente debatidos, nas comissões e nas audiências públicas, pelos parlamentares, especialistas e representantes da comunidade. Após serem sancionados em leis, os planos encontram, na realidade concreta, uma série de dificuldades e adaptações que vêm a ser necessárias. Por fim, a sociedade avalia se o plano foi construtivo e se alcançou seus objetivos iniciais. Observe como a correlação de forças políticas e as diversas visões sobre o papel da educação são fundamentais para a construção de uma política educacional efetiva e democrática.
Estado, Governo e Políticas Públicas: Concepções e Princípios
Agora tentaremos entender por quais caminhos uma política educacional passa até ser efetivamente colocada em prática.
Podemos pensar as políticas públicas como um processo composto por um conjunto de etapas que visam atender a certas demandas sociais. Rodrigues (2010) descreve os ciclos principais. Observe-os no infográfico a seguir.
Etapas das Políticas Públicas
Preparação da decisão política
o governo busca solucionar um problema para uma situação específica e identificar as formas como pode se envolver na questão dentro dos parâmetros das leis. Por exemplo, a necessidade de construir mais escolas, de adquirir mais material didático, de diminuir os índices de evasão escolar, etc.
Agenda Setting
é a formação da pauta, da agenda. Nesse momento, o problema se torna uma questão política, adquire o status de um problema público e se desenham os caminhos pelos quais a questão deve ser enfrentada.
Formulação
nessa etapa, a política pública começa a girar em torno das ações aceitáveis para lidar com o problema. Para isso, faz-se um diagnóstico da situação, abrangendo os possíveis obstáculos, como planejar e organizar as ações e por quais caminhos a política será implementada.
Implementação
nessa etapa, a política entra efetivamente em funcionamento pela máquina burocrática do governo. Ocorre, então, a preparação para a prática.
Monitoramento
as agências administrativas conferem o conteúdo das políticas adotadas e as colocam sob escrutínio público.
Avaliação
é a etapa final, em que o governo e a sociedade avaliam se os objetivos foram alcançados e quais os efeitos gerados pela política.
Fonte: RODRIGUES, 2010
Vamos buscar entender por meio de um exemplo. Digamos que professores, em conjunto com os demais profissionais da educação e por intermédio de instrumentos avaliativos, detectem que os alunos estão apresentando níveis muito baixos de desempenho nas avaliações de matemática. Há vários caminhos para solucionar esse problema, como, por exemplo, a qualificação dos professores de matemática, na tentativa de construir um novo método pedagógico. Também é possível que uma avaliação identifique que os alunos não estão tendo alimentação e assistência médica para ter um bom rendimento. Enfim, existem várias maneiras de abordar a questão, porém, para que isso seja possível é preciso partir de pesquisas e dados corretos. A partir disso, o governo ou os profissionais da educação elaboram um plano de ação, que irá ao Congresso, será debatido e se transformará em lei. Após a implantação do plano, uma avaliação é feita, e são aferidos os resultados. Observe a imagem a seguir.
Fonte: Elaborada pelo autor.
Perceba o trajeto percorrido. O problema advém do interior da sociedade, é detectado pelo governo, torna-se uma ideia de política pública e percorre as etapas até retornar à sociedade como solução ou reformulação de uma política anterior.
Reforma da Educação a partir de 1990 e o Neoliberalismo
Durante grande parte do século XX, dois projetos de modernização estiveram em intensa disputa. Desde 1917, com a Revolução Russa e a criação da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS), o mundo encontrou-se diante de dois caminhos para alcançar o desenvolvimento. De um lado, está o capitalismo, sistema gestado a partir da ascensão da burguesia liberal europeia e da decadência das monarquias e que consolidou seu poder após a Revolução Industrial. De outro, o socialismo, construído teoricamente a partir da crítica ao capitalismo feita por Karl Marx e Friedrich Engels no final do século XIX e adotado na Rússia após a Revolução.
As rusgas desse debate sobre quais caminhos as sociedades deveriam seguir se aprofundaram no final de 1945 com o término da Segunda Guerra Mundial e o início do período que conhecemos como Guerra Fria. A URSS e os Estados Unidos despontaram como as duas grandes potências econômicas e militares daquele tempo, disputando, em um xadrez global, as suas áreas de influência pelo mundo. Em dezembro de 1991, após anos de guerras diretas e indiretas em países como Coreia, Vietnã e Afeganistão, mergulhados em uma corrida armamentista que assombrava o mundo com a possibilidade de armas de destruição em massa e de uma corrida espacial que gastou vultosos recursos, a União Soviética sucumbiu. Os Estados Unidos alçaram a posição de liderança global, e o capitalismo despontou como a ideologia vencedora da Guerra Fria.
SAIBA MAIS
Guerra Fria
A Guerra Fria foi a denominação dada pelo jornalista e comentarista de política internacional Walter Lippmann para os conflitos e as estratégias de disputa entre a União Soviética e os Estados Unidos logo após o fim da Segunda Guerra. O termo popularizou-se e tornou-se o nome da disputa entre os blocos socialista e capitalista entre 1945 e 1991. Toda a política do período foi fortemente influenciada por essa disputa internacional. Para saber mais sobre o tema, confira as aulas de Histórias das Relações Internacionais ministradas pelo professor doutor Felipe Loureiro, do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de São Paulo (USP), que estão disponíveis no YouTube pelo link: https://www.youtube.com/watch?v=HsAf_ObU9aM.
Fonte: Reis Filho (2008).
Em conjunto com o sistema capitalista, a partir da década de 1970, gestou-se nos centros do mercado global – principalmente nos governos de Ronald Reagan, nos Estados Unidos, e de Margaret Thatcher, na Inglaterra – um novo tipo de política liberal, conhecida como neoliberalismo.
O neoliberalismo teve como expoentes principais os economistas Friederich Hayek e Milton Friedman. David Harvey definiu a ideologia neoliberal como:
O neoliberalismo é em primeiro lugar uma teoria das práticas político-econômicas que propõe que o bem-estar humano pode ser melhor promovido liberando-se as liberdades e capacidades empreendedoras individuais no âmbito de uma estrutura institucional caracterizada por sólidos direitos a propriedade privada, livres mercados e livre comércio. O papel do Estado é criar e preservar uma estrutura institucional apropriada a essas práticas; o Estado tem de garantir, por exemplo, a qualidade e a integridade do dinheiro. Deve também estabelecer as estruturas e funções militares, de defesa, da polícia e legais requeridas para garantir direitos de propriedade individuais e para assegurar, se necessário pela força, o funcionamento apropriado dos mercados (HARVEY, 2011, p. 12)
Como afirmamos anteriormente, a política econômica adotada por uma nação influiu profundamente na política educacional adotada. Mesmo que exista um consenso geral de que a educação é um investimento necessário para o desenvolvimento de um país, a quantidade de recursos e as formas de financiamento são debatidas diariamente por políticos, economistas e profissionais da educação.
Após o surgimento das políticas neoliberais na Europa e nos Estados Unidos, o neoliberalismo chegou à América Latina nos anos 1970, principalmente como a política econômica adotada por governos militares instaurados no Cone Sul, com destaque para as medidas políticas empregadas no Chile, durante a ditadura de Augusto Pinochet (1973-1990).
Segundo Roberto G. Bianchetti (2001), para analisarmos a orientação das políticas educacionais dentro do modelo neoliberal, devemos considerar dois aspectos:
1) As tendências teóricas da concepção social do liberalismo que está dentro da proposta e dos objetivos a serem alcançados pelo sistema educativo;
2) As políticas para a educação propostas por governos neoliberais como parte das políticas sociais.
Nesse primeiro aspecto, podemos sintetizar como o arcabouço teórico neoliberal pensa os indivíduos. Nesse caso, trata-se de uma perspectiva profundamente econômica. O sujeito ou o cidadão é visto como a molécula que compõe o mercado. Na busca por seus interesses privados, os sujeitos se relacionam no livre mercado – quanto menores forem as barreiras que o Estado impõe, maior é a eficiência desse funcionamento.
Assim a educação pública, controlada pelo Estado, é vista como prejudicial ao sistema de ensino. Veja que toda a legislação educacional que define os objetivos e as metas pode ser interpretada pelos neoliberais como intervenção do Estado. Nesses casos, geralmente o neoliberalismo defende a privatização parcial ou total das escolas e das universidades, fazendo assim da educação uma mercadoria a ser comercializada no livre mercado.
Segundo a perspectiva de Bianchetti, o economista Milton Friedman enxerga a educação como um instrumento que permite dar, a cada sujeito, uma função social previamente destinada. Nesse caso a desigualdade não é algo negativo, mas apenas um resultado natural das diferenças entre os indivíduos (BIANCHETTI, 2001). Friedman diz que “em escolarização, pais e filhos são os consumidores e o mestre e o administrador da escola, os produtores. A centralização na escolaridade trouxe unidades maiores, redução da capacidade dos consumidores de escolher e aumento do poder dos produtores” (FRIEDMAN, 1980).
Dessa forma o neoliberalismo no Brasil dos anos 1990 se caracterizou pelas tentativas de descentralização da política educacional. Podemos ver os efeitos dessa política neoliberal no PNE 2001-2010 analisado anteriormente. O governo federal, em sua proposta, transferiu a responsabilidade da gestão educacional para estados e municípios. Assim, segundo a perspectiva neoliberal, reduz-se a burocracia e os gastos do governo e se transforma a educação em pequenas unidades descentralizadas e mais eficientes (BIANCHETTI, 2001).
Essa mercantilização dos indivíduos e da educação como produto torna as categorias sociais de análise como sendo meramente econômicas. Nessa visão, a desigualdade é vista como algo comum dentro das sociedades de mercado livre. Na teoria neoliberal, ela seria amenizada pela produção da riqueza gerada pela livre concorrência, e essa riqueza transbordaria das grandes empresas para as camadas mais pobres da sociedade, produzindo emprego e renda. No entanto, essa constatação se mostrará errônea sob o escrutínio da História, principalmente quando aplicada em países com altos índices de desigualdade, como o Brasil. A avaliação da política neoliberal no Brasil de 1990 produziu o aprofundamento das desigualdades e a concentração da riqueza nas mãos de poucos indivíduos.
Lembremos, porém, que o ensino privado – seja básico ou universitário – possui um papel central na educação brasileira, que ainda caminha para alcançar suas metas. Nas últimas décadas, com a junção do financiamento público de cursos por intermédio do Fundo de Financiamento ao Estudante do Ensino Superior (FIES) e a iniciativa privada, ocorreu uma expansão no acesso de jovens às universidades. Esse é o exemplo da junção de uma política educacional pública e de ums política econômica de livre mercado que funcionou, mesmo que elas não sejam perfeitas.
REFLITA
Fies
O Fies talvez seja o exemplo mais recente de política pública atrelada às instituições privadas de ensino no Brasil. Para entendermos a sua dimensão, em 2014, foram gastos 13 bilhões de reais com o financiamento, atendendo a 26% de todos os alunos matriculados em instituições de ensino superior. Quais outras políticas de governo podem ser elaboradas para unir o interesse público e privado?
Fonte: VENTURI, J. J. Fies: dois meses de incertezas. Blog Abmes. Disponível em: https://blog.abmes.org.br/jacir/
Organizações Internacionais: Propostas para a Educação Brasileira
Organizações Internacionais: Propostas para a Educação Brasileira
Outro aspecto resultante do mundo pós-Guerra Fria e que se intensificou no século XXI foi a globalização. Atualmente, estudiosos têm discutidos os seus efeitos, tanto positivos quanto negativos. Muitos apontam para os seus efeitos benéficos, como o aumento da velocidade das comunicações e o crescimento da distribuição global de recursos. Outros destacam o lado negativo, principalmente o aumento da desigualdade e da concentração de renda nas mãos de um pequeno grupo de pessoas e empresas. Mas, afinal, o que é globalização? Trata-se de conceito complexo e com vários significados.
Expusemos, no tópico anterior, alguns efeitos do neoliberalismo sobre a educação, uma ideia política que perpassou os países europeus e os Estados Unidos até alcançar a América Latina nos anos de 1980 e 1990. A transnacionalização tem por objetivo a internacionalização de pensamentos e a criação de mercados nacionais integrados globalmente, criando uma estrutura global de comércio e serviços. Essa estrutura não é somente econômica; por ela fluem ideias, culturas, aspirações de consumo e questões sobre o papel da educação no mundo globalizado.
Para Hirst e Thompson (1997, p. 246), a “globalização trata dos processos que promovem a interconexão internacional, aumentando fluxos de comércio, investimento e comunicação entre as nações”. A internet é um dos resultados mais evidentes da globalização.
Em suma, as atuais políticas educacionais funcionam no contexto da globalização. Para José Carlos Libâneo (2016), a internacionalização das políticas educacionais é alavancada por uma série de agências com finalidades monetárias, financeiras e de crédito, que formulam políticas públicas para países emergentes. Dois órgãos criados pelo governo dos Estados Unidos tiveram papel de destaque no financiamento internacional e na proposição de políticas educacionais: o Fundo Monetário Internacional (FMI) e Banco Mundial (BM). Essas agências, criadas ao final da Segunda Guerra Mundial, tiveram inicialmente o objetivo de financiar a reconstrução dos países europeus devastados pelo conflito. Paulatinamente, adquiriram o caráter de financiadoras de empréstimos aos países em desenvolvimento para a aquisição de infraestrutura e impuseram políticas de controle orçamentário (LIBÂNEO, 2016).
Além das instituições financeiras, outras organizações atuam na elaboração dos objetivos e das metas da política educacional. Podemos citar, por exemplo, a Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura (Unesco); o Banco Interamericano do Desenvolvimento (BID) e a Organização para o Desenvolvimento e a Cooperação Econômica (OCDE).
Essas agências internacionais, sumariamente, possuem objetivos relacionados à internacionalização e à abertura de mercados para a globalização da economia. De modo geral, os organismos internacionais sempre apontam a lógica da mercantilização da educação para o Brasil, tentando transferir gradativamente a responsabilidade da gestão educacional do país para a iniciativa privada. Para Leher (1998, p. 9):
longe de ser uma questão marginal, a educação encontra-se no cerne das proposições do Banco Mundial, como um requisito para a inexorável globalização, cumprindo a importante função ideológica de operar as contradições advindas da exclusão estrutural dos países periféricos que se aprofunda de modo inédito. O Banco Mundial inscreve a educação nas políticas de aliviamento da pobreza como ideologia capaz de evitar a “explosão” dos países e das regiões periféricas e de prover o neoliberalismo de um porvir em que exista a possibilidade de algum tipo de inclusão social (“todo aquele que se qualificar poderá disputar, com chance, um emprego”), para isto, a coloca no topo de seu programa de tutela nas regiões periféricas.
Quando analisamos os estudos elaborados pelo BID e pelo BM para a educação, identificamos algumas recomendações:
1) A alocação de recursos com prioridade para a educação básica;
2) O objetivo de descentralizar a administração das escolas e compartilhar os seus custos com a sociedade local, reduzindo os gastos governamentais com educação;
3) Ser de incumbência do governo apenas fixar primordialmente padrões e monitorar o desempenho dos alunos;
4) O investimento prioritário ser em infraestrutura, ou seja, equipamentos e materiais escolares;
5) Nada ser abordado o tema da qualidade de formação e da remuneração dos profissionais da educação.
Perceba que todas essas recomendações estão dentro de parâmetros pensados pela influência do neoliberalismo na educação.
Podemos notar, a partir do PNE 2001-2010, como muitas das recomendações dos órgãos internacionais, principalmente do BID e do BM, foram absorvidas nos nossos planos nacionais. As fortes críticas feitas ao PNE 2001-2010 foram direcionadas ao seu caráter descentralizador e de linhas neoliberais, demovendo o governo de suas responsabilidades principalmente relativas ao financiamento dos projetos que permitiriam o alcance das metas. Algumas das críticas feitas ao PNE em questão foram que as metas eram muitas e que o dinheiro destinado para cada uma foi escasso, pulverizado em propostas inócuas.
Direito à Educação, Cidadania, Diversidade e Direito à Diferença: Presença ou Ausência nos Aparatos Legais e Normativos
Em um país multicultural como o Brasil, qualquer política educacional que não englobe o tema da diversidade torna-se quase automaticamente ineficaz. O Brasil é um país de dimensões continentais e de forte presença indígena, africana e portuguesa mesclada com inúmeras outras etnias, tanto europeias quanto asiáticas, sendo, portanto, marcado pela pluralidade de culturas.
A diversidade, desse modo, é a manifestação dessa variedade humana. Infelizmente, o reconhecimento da importância desses povos para a formação social brasileira só ocorreu tardiamente. Apenas em 2003 a Lei nº 10.639 foi sancionada, tornando obrigatórios, nas escolas brasileiras, os estudos da cultura africana, afrodescendente e da cultura indígena. Posteriormente, integraram-se na legislação as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Indígena.
Essas diretrizes só adentraram a legislação educacional após décadas de lutas dos movimentos sociais identitários, tais como o movimento negro e quilombola. Na mesma seara, adentraram na escola os debates sobre relações étnico-raciais, relações de gênero, diversidade sexual e questões ambientais, mesmo que sob fortes críticas de alas mais conservadoras da sociedade.
Segundo Gomes (2008, p. 70):
em uma sociedade multirracial e pluricultural, como é o caso do Brasil, não podemos mais continuar pensando a cidadania e a democracia sem considerar a diversidade e o tratamento desigual historicamente imposto aos diferentes grupos sociais e étnico-raciais.
Se o objetivo geral da educação é incluir as minorias excluídas da sociedade, torna-se fundamental a inclusão dessas camadas da sociedade no sistema de ensino. É devido a esse objetivo que o PNE em vigor, Lei nº 13.005/2014, apresenta metas específicas para a questão da diversidade na escola e nas universidades públicas.
A meta 4 do atual NPE dispõe:
universalizar, para a população de 4 a 17 anos com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação, o acesso à educação básica e ao atendimento educacional especializado, preferencialmente na rede regular de ensino, com a garantia de sistema educacional inclusivo, de salas de recursos multifuncionais, classes, escolas ou serviços especializados, públicos ou conveniados (BRASIL, 2014, on-line).
Já a meta 8 objetiva:
elevar a escolaridade média da população de 18 a 29 anos, de modo a alcançar, no mínimo, 12 anos de estudo no último ano de vigência deste plano, para as populações do campo, da região de menor escolaridade no país e dos 25% mais pobres, e igualar a escolaridade média entre negros e não negros declarados à fundação instituto brasileiro de geografia e estatística (IBGE) (BRASIL, 2014, on-line).
O PNE 2014-2024 tem como escopo a busca ativa por ações inclusivas e de valorização da diversidade. Nesse sentido, as escolas e os profissionais da educação têm buscado o crescimento das ações inclusivas nas instituições de ensino, ao mesmo tempo em que adotam iniciativas que valorizem os conhecimentos diversos dos alunos.
O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA)
Outro importante documento que compõe a legislação educacional brasileira é o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). O ECA foi criado em 1990 e alterou profundamente as concepções anteriores sobre o papel da criança e do adolescente na sociedade, bem como o papel do Estado no cuidado com esses indivíduos.
Antes do ECA, três códigos versaram, em diferentes momentos, sobre os menores de idade: o Decreto nº 5.083, de 1º de dezembro de 1926; o Decreto nº 17.943-A, de 12 de outubro de 1927, conhecido como Código Mello Mattos; e a Lei nº 6.697, de 10 de outubro 1979. Segundo Salles e Moreira (2015), esses códigos possuíam duas características:
1) Não tratavam das crianças e dos adolescentes em si, mas apenas dos transgressores, delinquentes e abandonados;
2) Consideravam crianças e adolescentes passíveis de medidas judiciais (como o afastamento familiar e a realocação para instituições disciplinares) e desprovidas de direitos.
O ECA alterou completamente essa legislação anterior, entendendo como crianças os indivíduos de zero a 12 anos e adolescentes os de 13 a 18 anos. O ECA garantiu às crianças e aos adolescentes todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana. Além disso, tornou obrigação legal dos pais matricular seus filhos nas instituições de ensino.
Fonte: Andrea Obzerova / 123RF.
Por parte das escolas, é obrigatório comunicar aos conselhos tutelares casos de maus-tratos, faltas injustificadas, evasão e repetência em série. É importante salientar que a legislação prevê punições caso essas informações não sejam repassadas para o Conselho Tutelar. Segundo Salles e Moreira (2015), o ECA transformou-se em um importante instrumento de garantia da educação na infância e na adolescência. A seguir, constam alguns poderes que o ECA possibilitou aos Conselhos Tutelares:
● Requisitar serviços públicos na área de educação (artigo 136, III, “a”). Considerando os direitos assegurados aos estudantes, as requisições podem ter como objeto a vaga escolar e todos os insumos previstos em lei (transporte, alimentação, materiais didáticos etc.). Caso o Conselho Tutelar não seja atendido, compete-lhe representar junto à autoridade judiciária (artigo 136, III, “b”) por descumprimento injustificado de suas deliberações. Isto caracteriza infração administrativa, cuja pena é de multa de três a vinte salários de referência, aplicando-se o dobro em caso de reincidência (artigo 249);
● Advertir formalmente os pais ou responsável em casos de faltas escolares injustificadas, evasão e elevados níveis de repetência (artigo 136, II e 129, VII);
● Determinar aos pais ou responsável que matriculem os filhos/pupilos e acompanhem sua frequência e aproveitamento escolar, podendo representar junto à autoridade judiciária no caso de descumprimento injustificado da deliberação (artigo 136, II, 129, V, 136, III, “b”);
● Encaminhar ao Ministério Público notícia de fato que constitua infração administrativa ou penal contra os direitos da criança ou adolescente, como por exemplo, nos casos de desrespeito dos profissionais da escola com os estudantes e/ou de não comunicação de maus tratos etc. (artigo 136, IV, 232 e 245) (BRASIL, 1990, p. 187-188).
O ECA criou um escudo legal em torno da infância e da adolescência, reconhecendo essas fases da vida como momentos frágeis e sensíveis, em que é necessário um cuidado especial. Historicamente, menores de idade eram tratados como pequenos adultos, passíveis das mesmas penas e responsabilidades que estes, mas sem os mesmos direitos. A sociedade mudou seu entendimento sobre as fases da vida, e o ECA é a síntese dessas medidas protetivas que visam acolher os menores de idade. Entre essas medidas, a garantia total e a responsabilização dos pais e das escolas de fornecer educação são algumas das principais.
Indicação de leitura
Livro: Pedagogia do Oprimido
Autor: Paulo Freire
Ano: 1ª ed. 1970; 65ª ed. 2018
Editora: Paz e Terra
ISBN: 978-85-7753-164-6
Sinopse: Paulo Freire é o educador mais reconhecido do Brasil no exterior. O pedagogo é o terceiro autor mais citado na área de Ciências Humanas no mundo. Entre a sua vasta obra, “Pedagogia do oprimido” destaca-se como uma crítica ao que Freire chama de “educação bancária”, em que o professor apenas “deposita” o conhecimento na cabeça do aluno. O autor propõe que os professores trabalhem com os conhecimentos prévios dos alunos, com assuntos que estão presentes no seu cotidiano. Não seria efetivo, por exemplo, trabalhar assuntos típicos da vida urbana em uma escola rural. “Pedagogia do oprimido” intitula-se assim pelo fato de o autor ver a educação como uma ferramenta de crítica, assim os sujeitos poderiam enxergar as opressões ao seu redor, sejam elas raciais, culturais ou econômicas. Freire basicamente afirma que é necessário ao aluno entender o mundo que o cerca e as formas de superar os obstáculos do presente.
Considerações Finais
Ao fim desta unidade, esperamos que tenha sido possível compreender de forma crítica os fundamentos, a organização e o funcionamento da política educacional brasileira, atrelada a um processo histórico que se altera ao longo do tempo, sendo Estado e sociedade precursores dessas mudanças. Ao passo que o Brasil avança e se moderniza, novas concepções são gestadas sobre o papel da educação. Dessa forma, é fundamental aos profissionais da educação manterem-se constantemente atualizados sobre os novos planos e metas elaborados pelo governo. Além disso, a reflexão deve ser permanente, sempre pensando nas melhores formas de abordagem para com as novas gerações.
Atividade
Para Romanelli (1986), a década de 1930 é o período de virada na história da educação no Brasil. Desde o período colonial, pouca coisa havia mudado substancialmente, e muito ainda era herança dos padres jesuítas.
Fonte: ROMANELLI, O. História da Educação no Brasil. 8. ed. Petrópolis: Editora Vozes, 1986.
Assinale a alternativa correta que corresponde à construção do manifesto do intelectual.
Houve um movimento retrógrado com relação à educação no Brasil, o qual se deu pelo aumento do número de trabalhadores em indústrias e pela diminuição do tempo acessível para o estudo.
Incorreta: Houve um movimento de aumento no número de alunos nas escolas por dois fatores, que são o crescimento demográfico e a intensificação do processo de urbanização.
Por meio do processo tardio industrial que ocorreu no Brasil, intensificado na década de 1930, houve maior demanda por tornar o sistema educacional voltado para um público que buscava a profissionalização, o que também foi impulsionado por um gradual aumento demográfico e pela intensificação do processo de produção.
Correta: A alternativa está correta, pois houve maior demanda por tornar o sistema educacional voltado para um público que buscava a profissionalização, como explicado por Romanelli, causada pela construção social mencionada.
Getúlio Vargas, ao assumir a presidência, declarou o fim do sistema educacional público, implantando o sistema de ensino técnico no lugar.
Incorreta: Isso não aconteceu. Houve sim uma adaptação do sistema educacional, voltada para a demanda da classe trabalhadora, mas não uma substituição.
Romanelli equivocou-se em relação à década; isso ocorreu na década de 1980, durante o período do governo militar.
Incorreta: O autor está correto sobre a década em que isso ocorreu. Na década de 1980, houve outro avanço na industrialização do Brasil, mas pelo período conhecido como Ditadura Militar.
Essa mudança se deu em favor das cotas para as mulheres, que passaram a ter maior acesso ao sistema educacional gratuito e de qualidade.
Incorreta: Nunca existiu cota para as mulheres no sistema educacional brasileiro.
Atividade
“O PNE 2001-2010 foi constituído de duzentas e noventa e cinco metas, agrupadas em cinco prioridades. Esse foi o resultado de uma intensa disputa no legislativo envolvendo duas versões do plano. O primeiro projeto a chegar no Congresso para debate foi o Proposta da Sociedade Brasileira, construído coletivamente por profissionais da educação e várias organizações da sociedade civil, foi apresentado como oposição ao projeto do governo. O Poder Executivo apresentou outro projeto intitulado Proposta do Executivo ao Congresso Nacional.”
Fonte: MOURA, E. S. A Construção do Plano Nacional de Educação 2014-2024: movimento sociais e participação na tramitação no Legislativo. 2015. Dissertação (Mestrado em Educação) – Universidade Federal Fluminense, Niterói, 2015.
Com base no PNE 2001-2010, é correto afirmar:
O PNE 2001-2010 tinha por objetivo desenvolver o capital humano para, assim, desenvolver a economia nacional.
Incorreta: A alternativa está incorreta, porque não condiz com a moral, que é base da criação do PNE 2001-2010.
O PNE 2001-2010 tem por base a moral da justiça social, além de reforçar que o principal objetivo da educação não é apenas desenvolver o capital humano, mas também aprimorar vários atores sociais dentro do Brasil.
Correta: A afirmativa condiz com os objetivos básicos da formulação do PNE 2001-2010.
O PNE 2001-2010 tinha por base não apenas desenvolver o capital humano, mas também aprimorar a força de produção da classe trabalhadora.
Incorreta: A alternativa está incorreta, porque não condiz com a moral, que é base da criação do PNE 2001-2010.
O PNE 2001-2010 tem por base a moral da justiça social, além de reforçar que o principal objetivo da educação não é apenas desenvolver o capital humano, mas aprimorar vários atores sociais dentro do Brasil.
Incorreta: A alternativa está incorreta, porque não condiz com a moral, que é base da criação do PNE 2001-2010.
O PNE 2001-2010 tinha por princípio desenvolver o capital humano e aumentar o poder executivo brasileiro no sistema educacional, além de contemplar os problemas sociais, culturais, políticos e educacionais dos brasileiros.
Incorreta: A primeira parte da alternativa (“O PNE 2001-2010 tem por princípio desenvolver o capital humano e aumentar o poder executivo brasileiro no sistema educacional”) está incorreta, porque não condiz com a moral, que é base da criação do PNE 2001-2010.
Atividade
“Em escolarização, pais e filhos são os consumidores e o mestre e o administrador da escola, os produtores. A centralização na escolaridade trouxe unidades maiores, redução da capacidade dos consumidores de escolher e aumento do poder dos produtores.”
Fonte: FRIEDMAN, M. Liberdade de escolher. Rio de Janeiro: Record, 1980.
Assinale a alternativa correta referente à afirmativa de Milton Friedman:
A reflexão de Friedman se dá por um viés neoliberal, que tem por base a busca incessante por resolver problemas sociais de forma cooperativa e colaborativa, juntamente com intervenções do Estado no sistema educacional.
Incorreta: A reflexão não condiz com a ideologia neoliberal. Como sabemos, a ideologia neoliberal tem por base a não intervenção do Estado e a valorização do individualismo.
Essa afirmativa evidencia uma visão neoliberal sobre o sistema educacional presente na formulação da PNE 2001-2010 ao distanciar o poder do Estado de questões sobre a educação pública.
Correta: A alternativa está correta, pois condiz com a perspectiva da ideologia neoliberal com relação à educação. A PNE 2001-2010 teve como característica principal a tentativa de descentralização da política educacional, ponto elementar do neoliberalismo na educação.
O neoliberalismo pressupõe total liberdade econômica, sem intervenção do Estado. Friedman, nesse contexto, afirma que o sistema educacional precisa de maior quantidade de produtores europeus no Brasil.
Incorreta: Friedman não afirma que há uma maior necessidade de produtores europeus no sistema educacional brasileiro.
Friedman afirma que há uma importante necessidade de reeducar a sociedade brasileira para que possa deixar de existir a educação pública.
Incorreta: Friedman não faz essa afirmativa. O autor sugere que a educação deve ser pensada como um sistema de produção ou uma linha de montagem em que professores e escolas produzem, e pais e alunos consomem.
O neoliberalismo tem como viés privatizar o máximo de serviços públicos possíveis, com a intenção de criar serviços colaborativos, que não visem ao lucro.
Incorreta: A alternativa não condiz com a ideologia. O neoliberalismo prega que todo indivíduo, na sociedade capitalista, busque o lucro em seu trabalho. Dessa forma, oferecendo serviços na livre concorrência, os produtos se tornam competitivos e baratos.